Na França, o ideal de democratização da cultura
nasceu da aspiração à afirmação republicana do princípio de igualdade entre os
cidadãos. Foi esse mesmo ideal de democratização da cultura que constituiu a
principal fonte de justificação e legitimidade da existência de políticas
culturais na França. De fato, o grau de democratização da cultura tornou-se o
principal referente de julgamento e avaliação das políticas culturais. E desde a década de 1950, a evolução das práticas culturais tornou-se assunto de interesse de Estado na França, resultando no financiamento público de sondagens longitudinais sobre as práticas culturais dos franceses.
Na Alemanha, também, a relação entre Cultura e
Política foi tratada como uma questão de projeto de Nação. Os alemães
enxergavam na valorização da sua história cultural a fonte de sua autolegitimação e justificação de seu orgulho como
Cultura Nacional. Segmentos letrados da classe média alemã do século XVIII compreendiam o florescimento da literatura, das artes e da filosofia como um modo de se construir e se perceber como nação singular e culturalmente autêntica.
Posto isso, é lamentável o modo como alguns tem justificado o
fim do Ministério da Cultura no Brasil. Defendem que o MinC servia apenas para
fornecer dinheiro aos artistas e produtores culturais. Uma interpretação
completamente distorcida e ignorante sobre o papel das políticas culturais no
Brasil.
A gestão de Juca Ferreira no MinC, com todas as dificuldades financeiras,
representava um avanço, principalmente pelo trabalho de inventário e
visibilidade nacional da diversidade de coletivos culturais e das práticas
culturais de diferentes comunidades populares e tradicionais. Se tratava de uma
política cultural que, no futuro próximo, possibilitaria mudanças no sentido de refazer e
atualizar nossa autocompreensão de quem nós somos como "brasileiros".
Esse papel de construção e atualização da identidade nacional não pode ser feito pelos dispositivos de mercado, pois sua lógica é de curto prazo. E descobrir e explorar novas potencialidades de uma cultura demanda muito tempo e demanda um princípio de simetria estranho ao modo de produção e circulação monetária da cultura.
A visibilidade nacional da diversidade cultural é fundamental para qualquer Estado-Nação, pois permite constituir um patrimônio de práticas, valores e crenças que podem oferecer um rico potencial semântico de inovação civilizatória. O Brasil tem uma riqueza cultural que é geopoliticamente estratégica em relação ao restante do mundo e não pode mais negligenciá-la como fez no passado. Qualquer projeto de Nação envolve a construção permanente atualização de uma identidade nacional imaginada. E a existência de uma política cultural nacional é pré-requisito para isso.